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Witch of Salem - resenha

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Mensagem por tiagovip Sex Jul 05, 2019 3:58 pm

"É surpreendente quanto horror existe no ser humano. Meu trabalho me levou a conhecer o pior, o mais terrível lado da humanidade, a face escondida das mentes distorcidas, o rosto do monstro que reside na psiquê do homem. É um abismo negro, profundo e, aparentemente, sem fim. Mas quis a vida me testar mostrando-me que eu não estava errado, porém havia uma questão de escala: o horror produzido pela humanidade é verdadeiro, contudo também é ínfimo quando comparado ao terror cósmico, alienígena, inominado que habita tanto nos recessos do universo quanto já conheceram nosso planeta como um entre tantos. Nessa escala onde entra o pavor inominável e repulsivo das entranhas do cosmos, a crueldade humana, ainda horrífica para entre os seus, é pálida e limitada. O abismo, infelizmente descobri para o meu eterno pesar e desconsolo, é muito mais profundo."

Extrato do diário de David Foster.


"Cada vez mais creio que a verdade é algo efêmero, fraco como um pensamento tardio. A verdade é o que os nossos sentidos humanos conseguem captar, ou é uma noção tão vaga e volátil quanto o certo e o errado? A primeira concepção é nitidamente mais concreta, e ainda mais restritiva, tornando o não-visto, o não-escutado, em suma, o não-sentido como inverdadeiro. Parece-me bastante falho tal conceito. Agregar a verdade ao arcabouço dos conceitos, das ideias, torna-a ampla e, ao mesmo tempo, finita ao grupo que a aplica - a verdade para mim pode não ser a mesma que para você, mas essa dicotomia parece-me excluir justamente a própria definição de verdade como algo exato, real. Assim, a que tipo de verdade posso eu aplicar ao que eu vi, àquilo que existe e, ainda assim, não posso explicar completamente, nem compreender em sua totalidade. Poderia tanto horror ser verdade, em qualquer versão dela? Rezo para que não."

Extrato do diário de Maggie Sterns.


"Quando meus sonhos começaram a se tornarem mais vívidos, eu sabia que havia algo errado, mas não conseguiria dizer o quê. Sabia, no entanto, que estava próximo. Naqueles instantes de confusão após o despertar repentino, enquanto o medo ainda perdurava e o suor ainda escorria, eu comecei a escutar algo além da minha respiração acelerada: o leve ruído de passos no corredor, como se fossem passos de crianças, que se afastava. Mas antes ouvia-os, ínfimos, na escada, depois no corredor e, anteontem, estava na frente da porta de meu quarto e, por Deus, eu estava na hospedaria da Ma! Achei que a perseguição dos passos não me seguiria para fora de minha casa, mas seguiu e me senti ainda mais indefesa. Só que, nesta noite, quando acordei do pesadelo recorrente, os passos tênues novamente se distanciaram e... eu juro, a porta do quarto estava aberta! Não posso mais dormir até isto acabar, de uma maneira ou de outra."

Extrato do diário de Jenny Baxter.


WITCH OF SALEM - O JOGO

Witch of Salem - resenha Pic564525



Geral:
Witch of Salem é um jogo cooperativo, fundamentado no tema dos Mythos, cujo maior expoente literário é o H. P. Lovecraft (diz-se que o jogo é baseado nos escritos do Wolfgang Hohlbein, mas, convenhamos, é baseado no Lovecraft mesmo), mas que foi expandido consideravelmente por escritores contemporâneos. A quem desconhece, os Mythos tratam de entidades cósmicas, mais antigas que o tempo conhecido. Alguns deles, junto de seus séquitos, vieram para a Terra, e a dominaram por incontáveis eras. Algum evento ignorado - suspeita-se da ação de outros Antigos - fez com que a Terra convulsiona-se e que os Grandes Antigos afastassem-se ou, aos que permaneceram, entrassem em um torpor do qual despertarão somente quando as estrelas estiverem corretas. Até então a presença deles é sentida em sonhos, em sugestões hipnóticas, em controle psíquico, em imagens oníricas, com as quais agregam pessoas - e também coisas além da percepção da realidade mundana -, as quais os idolatram e, juntos, formam cultos horrendos que têm a intenção de agir quando os alinhamentos galáticos ocorrerem, realizando os rituais necessários para acordar os Grande Antigos, de forma que estes voltem a, uma vez mais, controlar com seus infinitos terrores a Terra e outras dimensões. Pois não está morto aquilo que pode eternamente jazer, e em estranhas eras até mesmo a morte pode morrer.


Regras:
No que tange regras, o Witch of Salem está no lado dos mais leves. A preparação para a partida é rápida: cada jogador recebe um item aleatório para seu personagem; coloca-se todos os peões que representam os personagens e o Bruxo de Salem na Universidade de Miskatonic; põe-se o marcador do Necron no espaço inicial; preenche-se todos os espaços nas localidades com itens aleatórios; sorteia-se 6 das 8 peças de portais e as mesmas são colocadas nos seus respectivos espaços no tabuleiro - as duas excedentes vão para a caixa (isso faz com que exista de 2 a 4 portais verdadeiros no tabuleiro); embaralha-se as cartas de Eventos e 4 delas são removidas - quando a pilha das cartas que permaneceram for esgotada, embaralha-se novamente as cartas, incluindo-se as 4 que haviam sido deixadas de lado, e então 4 novas cartas são removidas; embaralha-se as cartas de criaturas e, então, de acordo com o número de personagens (que pode ser diferente do número de jogadores - um jogador pode usar 2 personagens, por exemplo), revela-se determinado número de criaturas, colocando-as no tabuleiro; embaralha-se as seis cartas de Grandes Antigos e estas são dispostas, escondidas, nas cinco posições ao redor do tabuleiro e, a sexta, vai no tabuleiro, em R'lyeh - é este o Grande Antigo que os jogadores terão que revelar e enfrentar para vencer a partida. A preparação está pronta. Assim, vem a vez dos jogadores. Cada pessoa em seu turno:

Deve se mover. Para isto cada jogador tem 8 cartas representando cada uma das localidades do tabuleiro (o Sanatório, o Jornal, a Casa da Bruxa, o Hotel, a Igreja, o Cemitério e a Universidade de Miskatonic - a 8ª carta é a Passagem Secreta). Ao usar uma carta, o jogador fica bloqueado de retornar para ela, pois a carta de tal lugar foi usada. É possível retornar uma vez para um local, com o uso da carta Passagem Secreta (mas ela implica no gasto de 1 ponto de Sanidade). O personagem do jogador não pode permanecer no lugar que está - o movimento é obrigatório e é sempre a primeira ação a ser realizada. Caso o jogador retorne para a Miskatonic, ele recupera todas as cartas de localidades utilizadas anteriormente;

Trocar itens. Se um jogador mover seu personagem ao local em que está um outro, ele poderá trocar, dar ou receber itens. Note que esta ação não pode ser realizada se, no começo do turno, ambos estiverem no mesmo local, pois a primeira - e mandatória - ação é mover o personagem. Cada jogador pode carregar um máximo de 3 itens, mas é permitido descartar itens para receber/pegar outros;

Ser atacado por uma criatura. Se houver uma criatura agindo na localidade para a qual o personagem for, o jogador rolará o dado de perdas. O personagem perderá o que for indicado no dado (quatro faces mostram itens, outra causa a perda de 1 ponto de sanidade e a última provoca o avanço do marcador do culto de Necron). Se o personagem não tiver o item indicado pelo dado, nada acontece. As criaturas não atacam se no local estiver o Bruxo de Salem (logo o dado não é rolado);

Atacar uma criatura. Caso o personagem tenha os itens necessários para expulsar/destruir uma criatura, isso ocorre de forma automática, sem o gasto dos itens (basta tê-los);
Witch of Salem - resenha Pic381067

Usar um item. Aqui o jogador pode utilizar:
a) a Adaga de N'gaa. Se, por ventura, o Bruxo de Salem estiver no mesmo local, o jogador pode descartar uma Adaga (um item) e derrotar a criatura, mesmo sem ter os itens exigidos;
b) o Necronomicon. Revela-se, então, a próxima sombra dos Grandes Antigos. Se for revelada a Sombra em R'lyeh, o efeito dela começará a ser aplicado;
c) o Elixir de Nus (eu chamo só de Poção). O personagem recupera 1 ponto de sanidade. Se, por ventura, o Bruxo de Salem estiver no mesmo local, a Poção recuperará 2 pontos de sanidade;
d) o Óculos Arcano. Com isto o jogador revela, para si, um dos portais. Isso é necessário para descobrir se, no local, existe um portal verdadeiro ou um falso. Ao jogador não é permitido falar sobre o que viu. Ele pode dizer "Eu já verifiquei a Igreja", mas não pode falar se ali existe um portal verdadeiro ou um falso;
e) a Chave. Ao usar uma Chave, o jogador a coloca ao lado de um portal, indicando que o mesmo foi selado. Uma das exigências para vencer a partida é que todos os portais verdadeiros estejam selados. Se um portal falso que seja for selado, os jogadores perdem a partida;

Coletar um item. Em todos os locais, exceto na Universidade, existem de 1 a 3 itens disponíveis para coleta. O jogador pode pegar um, e somente um, deles de cada vez. Alguns dos espaços para os itens não exigem custo, outros demandam que um preço seja pago (perder 1 ou 2 pontos de sanidade, trazer uma nova criatura, ativar um Evento, avançar o marcador de Necron em 1 ou 2 espaços).

A ação de coletar itens é a última do turno do jogador. Após ela a vez passa ao jogador seguinte. Quando todos os jogadores tiveram a sua vez, vem a fase de Eventos e de Criaturas. Na fase de Eventos, pega-se um Evento e aplica-se os efeitos do mesmo - em todos é indicado o movimento do Bruxo. Existem dois tipos de Eventos: os positivos (com Robert Craven de fundo) e os negativos (com o Necron de fundo).

Após a fase de Eventos, novas criaturas são reveladas, de acordo com o número de personagens (em quatro personagens, por exemplo, sempre são reveladas, a cada rodada, 2 criaturas; em três jogadores, numa rodada revela-se 1 criatura, na rodada seguinte, duas, depois uma, depois duas, e assim em diante). Se ocorrer de ser revelada uma criatura que já está no tabuleiro, o efeito da mesma é ativado, e existem cinco tipos de efeitos:
a) a criatura exige o gasto de certos itens. Caso isto não ocorra, o marcador do Necron avança até o próximo espaço com o rosto dele;
b) a criatura faz com que o marcador de Necron avance 3 espaços;
c) cada jogador rola 2 vezes o dado de perda, e seu personagem sofre os resultados de ambas as rolagens;
d) a criatura exige o gasto de certos itens. Caso isto não ocorra, todos os personagens perdem 2 pontos de sanidade;
e) todos os portais, que não estejam selados, são misturados e redistribuídos (entre os que estão no tabuleiro, tal embaralhamento não envolve as duas peças que foram deixadas na caixa).

Há, no baralho das criaturas, duas especiais: o Robert Craven, que faz todos os personagens e o próprio Bruxo de Salem retornarem para Miskatonic; assim todos os jogadores recuperam as cartas de localidades usadas, tal como se tivesse se movido normalmente para a Miskatonic; mas o Robert Craven não substitui uma criatura, então, uma criatura adicional é revelada (por exemplo, se duas criaturas devem ser reveladas, e a primeira foi o Robert Craven, ainda restará revelar duas criaturas). A outra especial é o próprio Necron e o efeito dele é, usualmente, drástico: o marcador dele avança 1 espaço por criatura no tabuleiro e mais 2 espaços se houver uma Sombra dos Grandes Antigos em Miskatonic. Isso usualmente faz a partida ir de "sob controle" para "corram! corram!" em um salto só.

Encerrada a fase de criaturas, a vez volta aos jogadores. E assim segue até que os gatilhos de final de jogo sejam ativados. Eles são:

- caso o marcador de Necron chegue ao espaço com tentáculos e nem todas as Sombras dos Grandes Antigos foram reveladas, os jogadores perdem;

- caso o marcador de Necron chegue ao espaço final de sua trilha, os jogadores perdem;

- caso os jogadores achem que selaram todos os portais verdadeiros, e que haja um jogador em R'lyeh (para chegar ali usa-se uma carta de Passagem Secreta), e um outro jogador vá até Miskatonic de posse de uma Chave e use-a para selar o portal ali, a partida termina. Então revelam-se todos os portais: se algum portal verdadeiro ficou sem selo, os jogadores perdem; se algum portal falso foi selado, os jogadores perdem; se todos os portais verdadeiros foram selados, se nenhum portal falso foi selado, se a Sombra em R'lyeh foi derrotada (para isto é necessário um conjunto específico de três itens, indicados na carta do Grande Antigo) e se o portal em Miskatonic foi selado, então os jogadores vencem! E sim, é tão difícil de vencer quanto soa.

E as regras são, basicamente, essas.


Profundidade:
Witch of Salem é um jogo que não exige um tremendo tempo de aprendizado para ser compreendido e para que os envolvidos saibam o que estão fazendo, o que podem fazer e as consequências de suas ações. Uma partida, no máximo. Normalmente, nem isso. É bem comum que eu, com 20+ partidas em meu currículo, ser lembrado de coisas, receber dicas e ouvir estratagemas dos marinheiros de primeira viagem.

No entanto, também é verdade que somente uma série de partidas lhe mostrará alguns padrões do jogo, os quais revelam um pouco do que é necessário para vencê-lo (cooperativos, afinal, tendem a serem enormes quebra-cabeças, nos quais várias das peças estão viradas para baixo e você sequer pode mexer nelas até que tenha já começado a montar). Isso advém de conhecer os 12 Eventos que existem no jogo; de saber que as criaturas têm que ser enfrentadas sempre que possível e deve-se dedicar tempo para coletar itens necessários para eliminá-los (pois pode não parecer que eles são grandes problemas, mas as rolagens dos dados de perda tendem a minar severamente os personagens, e o perigo da carta dupla e da carta do Necron é alto demais). Tal ação de caçar as criaturas normalmente fica em segundo plano, com os investigadores envolvidos em revelar portais e Sombras, mas essas duas ações podem ser realizadas em um passo mais contido, enquanto as criaturas não esperam. Ademais, os poderes do Bruxo de Salem devem ser usados irrestritamente: andar junto dela evita rolagens do dado de perda e permite eliminar criaturas só com o uso da Adaga. Vi diversos planos serem duramente atrasados por um "dane-se, eu vou até lá!" e, por certo, a rolagem causa a perda de um item essencial ao plano, ou mesmo provoca a perda da inestimável sanidade.

É relevante dizer que, apesar de partidas múltiplas tornarem o jogador mais atento a certos pontos, isso não significa uma redução da dificuldade. O Witch of Salem é quase desesperador de tão difícil, seja para novatos ou veteranos. Em 21 partidas eu venci três vezes e em apenas uma delas foi com um mínimo de folga, as outras duas foi segurando a vitória com a ponta dos dedos enquanto a derrota chuta-lhe na cara tentando derrubá-lo. Nessas vitórias era assim: "Role o dado. Se sair o símbolo do Necron, perdemos. No Evento, se vier o que perde Sanidade ou o que avança o Necron, perdemos. Agora revele as novas criaturas. Se vir um Verme da Lava, um Carniçal, um Zumbi ou um Profundo, perdemos", e assim em diante. É andar sob óleo e cacos de vidro, na beira do Abismo, vendado, numa ventania com granizos. Eu achava que o Space Hulk: Death Angel – The Card Game era difícil, e ele ainda é, mas não neste nível.

Então, se você procura um jogo para se tornar melhor, ganhar experiência e transformar a curva de aprendizado numa onda de vitórias que surpreenderá e chocará os novatos incautos, então o Witch of Salem não é para você. Nele vai ser como treinar tiro e luta desarmada, conseguir um trabalho de segurança de elite protegendo um figurão qualquer, e então ocorrer uma invasão, daí você descobre que intruso é o Rambo, ou o Chuck Norris. Você está treinado, mais do que a maioria, e sabe das coisas, mas vai tomar porrada como tal qual o pelego que veio entregar água se este se meter a besta.


Witch of Salem - resenha Pic552348
Tema:
Parece óvio que o Witch of Salem é um jogo temático, né? Só que não. Ele é um euro, ao estilo Pandemic, vestido em roupas da Nova Inglaterra do início do século XX. As regras sequer são temáticas: andar a todo o momento, mesmo quando se quer ficar no mesmo local para investigar mais? Vencer uma criatura por estar carregando 2 óculos - tudo bem, eles são mágicos e tal, mas são óculos, entende? O monstro vai morrer porque eu o enxergo melhor? Ele é o Lobo Mau? Atuar ao lado do Bruxo de Salem? É bem provável que alguma das mulheres mortas em Salem por serem bruxas, não fossem efetivamente bruxas, isso mesmo no cenário dos Mythos (na realidade fria de nosso mundo, é mais do que provável, claro). Só que Salem não é bem Arkham e, no bestiário das criaturas, as bruxas não eram amigáveis. Até enfrentam-se Bruxas como criaturas no jogo. E os Bruxos então são gente fina? Hã, não. O Whatley não era, certamente. O Robert Suydam era tão legal quanto um assassino serial. Porém isso quer dizer que todo feiticeiro vem do mesmo balaio? Olha... É que nos Mythos os heróis tendem a ser pessoas "mundanas", que trombam com o inominável e o incognoscível, pessoas de ciências, pessoas comuns em situações extraordinárias, tais como o policial Thomas Malone, o professor William Dyer, e assim em diante. Não é um absurdo completo agir ao lado do Robert Craven, o Bruxo de Salem, mas parece-me um contrassenso dentro da própria temática proposta - só que o Wolfgang Hohlbein quis assim, e OK, que seja. Eu reclamo, mas engulo, que nem remédio de gosto ruim que, no entanto, eu sei que me fará bem.

Witch of Salem faz poucas concessões temáticas e não me parece duvidoso que as mecânicas foram desenvolvidas antes de fixar um tema, até porque, contra o exame mais simples para verificar ligação entre tema e jogo, que é: se eu mudasse esse jogo para outro tema, eu teria que mudar alguma mecânica? O Witch of Salem falha, pois a resposta é sim. O jogo poderia ser sobre policiais lutando contra mafiosos, revelando os cabeças da organização e enfrentando os mais diversos criminosos da organização, enquanto fecham-se os locais de atividade ilícitas deles, mas se algum lugar errado for fechado, os processos envolvendo as ações ilegais da polícia farão que se perca toda a legitimidade da operação, tornando-a nula; e se os planos dos mafiosos chegarem ao ápice, haverão tantos policiais corruptos na força que não será mais possível vencê-los. Adagas viram Algemas, Necronomicon vira Fotos ou Cartazes de Procura-se, Poção vira Kit de Primeiros-socorros e Óculos viram Lupas. Eventos viram "Prefeito discursa a favor da segurança pública - Retorne o marcador dos Mafiosos em 1 espaço", "Carro passa atirando durante a noite - Cada investigador perde 2 pontos de vida", e assim em diante. Eu poderia pensar em outros, mas para ilustrar essa mudança de tema já serve para evidenciar que a ligação entre tema e mecânica é bem fraca.

Existe, adicionalmente, uma aresta temática que suscita inúmeras reclamações: a regra de que um jogador não pode dividir a informações sobre os portais com os demais. Entendo que não faz mesmo o maior dos sentidos. Eu tenho duas explicações (meio forçadas, reconheço, mas melhor do que nada) para isso: os investigadores confiam somente em si mesmos, sabendo que os agentes de Necron são vários e podem assumir as mais diversas guisas, incluindo àquelas de pessoas conhecidas - uma informação dessa importância não pode ser dividida de forma leviana, nem mesmo com cuidado, pois quem pode afirmar quem é leal à raça humana? Ou que ver é entender - apenas quem viu é capaz de fazer algum sentido, pois é algo basicamente indescritível, incognoscível e incompressível exceto pela exposição direta - basicamente não euclidiano e alienígena demais para nossas palavras e signos. Quem não gostar de nenhum fica com o "é assim porque é assim e pronto".

Por fim, ajudaria consideravelmente na imersão se os investigadores tivessem histórias em seus tabuleiros e alguma habilidade específica - uma vantagem e/ou desvantagem que lhe desse alguma característica particular. Como estão, eles são somente diferenciados por nome - que ninguém jogando se lembra qual é sem olhar - e por cor (que é como os participantes escolhem). Entendo que as habilidades exigissem mais testes do jogo, mas nada justifica a falta de história únicas para os personagens.


Produção:
É somente razoável. Primeiras as coisas boas: a arte é sensacional e vocês podem ver exemplos delas junto ao texto desta resenha. Sem erro nem exagero, foi a arte, junto dele ser cooperativo, que me levou à compra do jogo. A arte das cartas de criaturas, de Grandes Antigos e no tabuleiro é muito bem feita, dando o tom apropriado ao jogo. A arte dos tabuleiros pessoais dos jogadores é OK, nada demais, e aquela das cartas de Eventos, é apenas funcional - até pendendo para o lado do feio. As peças têm desenhos simples e se destacam bem, tanto no tabuleiro central quanto no dos jogadores, o que é o objetivo.

As demais peças são todas de médias para baixo. O dado é grande, com face entalhadas (o que dá uma sobrevida bem maior) pintadas - e parece bem equilibrado, mesmo sendo feito em algum tipo de cortiça. O marcador do Necron também é somente pintado e feito de madeira. Os peões dos investigadores têm diferenças, além da cor (as mulheres têm vestidos), mas poderiam ser melhores. O Bruxo tem um peão particular, branco. Tais peças lembram aquelas presentes nos euros mais sem alma que existem por aí. Veja bem, eu não exijo miniaturas em todos os meus jogos, e aqui elas nem seria necessárias também, contudo, se os marcadores dos personagens fossem como os do Arkham Horror já seriam suficientes - "ah, mas é mais fácil diferenciá-los como são", alguém pode dizer. Hum, ok, tem alguma verdade nisso, todavia, em minhas partidas, rara é a vez em que, em nenhum momento, alguém moveu a peça amarela quando o dele era a laranja e outras situações assim. Estou seriamente tentado a encontrar 5 miniaturas para substituir os peões, no entanto, até o momento, a inércia e a avareza estão vencendo.
Witch of Salem - resenha Pic388947

Agora a parte mais bizarra: o berço da caixa do jogo. Sem erro algum ele não foi feito para o Witch of Salem. Eu não sei para que jogo o berço foi feito, mas para o Witch of Salem ele não foi. Nada tem algum lugar específico e tudo parece ficar "errado" ali dentro. Assim, as cartas ficam quase apertadas, o saquinho com as peças fica ligeiramente acima da linha do berço, e coisas assim. Sorte que o jogo tem relativamente poucos componentes, então tudo cabe, com bastante espaço vago. Sei que este ponto é mais picuinha da minha pessoa, mas as coisas são como são.


Diversão:
Aqui é o ponto importante: o Witch of Salem diverte? A mim, e às pessoas com as quais eu jogo, eu posso dizer que sim. Tanto que um deles foi atrás e adquiriu sua própria cópia. E ele se tornou um jogo constantemente solicitado. Ele tem vários momentos de "ufa!" e de tensão, seja nas rolagens, seja nos Eventos.

A interação entre os participantes é sempre presente, é efetivamente necessário discutir o que fazer de forma que cada um potencialize as ações de seus investigadores. Isso, claro, dá margem ao jogador-alfa, até porque o jogo contém pouca informação secreta que esteja ao controle dos jogadores. Porém isso é mais um demérito da pessoa que do jogo. E a informação mais relevante do Witch of Salem é secreta: se os portais são verdadeiros ou não. Um jogador-alfa não vai poder mandar alguém pegar tal chave e ir a tal lugar e fechar certo portal, não que ele não queira, e sim porque ele não pode dizer que o portal que acabou de checar é verdadeiro. Nem vai saber se o que outro jogador viu é ou não. Isso praticamente trava a ação de um jogador-alfa e, se por nada mais, já vale manter a regra da forma como ela está.

O turno do jogador é ágil, com as ações sendo bem simples, diretas, sem enrolação. Então, mesmo jogando em quatro pessoas (o número máximo) o tempo entre as jogadas não é excessivamente longo. Além disso, todos os jogadores estão sempre envolvidos, pois nenhum irá poder "levar piano nas costas" sem a ajuda dos demais. De nada adianta selar portais se ninguém combate os monstros, ou coleta itens mais custosos de forma a que três novos venham, e outros possam agora pegar itens mais "baratos" e/ou necessários na situação.

Reforço que, entretanto, o Witch of Salem é brutalmente difícil de ser vencido. Tem pessoas que não irão gostar disso. E nem precisam ser pessoas que só gostam de vencer, mas que preferem algo mais próximo de 50%/50% na chance de perder e de vencer. O Witch of Salem está mais próximo de 80%/20% ou mesmo 90%/10% na porcentagem de derrota/vitória. O curioso? O manual do jogo sugere maneiras de dificultar a partida! Na época eu li com interesse, hoje eu considero uma piada do designer. Boa, Michael Rieneck, boa.


Vale a compra?
Ah, certamente. Só que é válido dizer que o jogo, de 2008, já é complicado de ser achado para venda em lojas online. Eu sei, é meio canalha fazer resenha de um jogo que não esteja disponível largamente para venda. Mas o que eu posso fazer, se é um jogo que eu tenho? Contudo, não perca a esperança. Existem cópias à venda no mercado do BGG e, pelo que sei, na Noble Knight: tem uma aqui e outra aqui, uma por US$ 30.00 e outra por US$ 35.00. Um preço que não é exagerado para um jogo que não está mais em produção.

Eu disse que o tema é fino no Witch of Salem, mas isso tem um efeito positivo: demonstrar que as mecânicas em si são sólidas, suficientes para manter o interesse dos envolvidos, mesmo que, inicialmente, eles tenham sido atraídos pelo tema do jogo. Esse é o meu caso. Boa parte das notas ruins que o Witch of Salem recebeu no BGG advém de dois fatos: ele ser difícil de vencer (nem todos apreciam a frustração frequente) e que ele não é um Arkham Horror com tempo mínimo de preparação e 1/4 da duração. Não há como circunavegar por esses dois pontos - ambos são reais. As experiências com o jogo envolveram pouca imersão temática e pilhas de derrotas. Eu aprecio o desafio - cooperativos fáceis eu tendo a deixar de lado. Era melhor que o jogo fosse mais denso no tema? Claro que sim. Mas o que tem ali me permite o suficiente para realizar alguns comentários e brincadeiras de cunho temático (como um Zumbi surgindo no Cemitério, ou Cthulhu detonando a sanidade do personagem).

Pode ser um ponto positivo que o jogo exija apenas conhecimento básico de Inglês: o manual é curto e as cartas têm duas, três frases quando muito. E é certamente positivo que o Witch of Salem possa ser explicado em 5 minutos e jogado em 30-45 minutos.

Portanto, para mim, o Witch of Salem substituiu completamente o Pandemic, pois o nicho deles é o mesmo em duração da partida e facilidade de explicação (maior no Witch of Salem, pois a falta de habilidades especiais e modos diferenciados de movimento ajudam neste caso). Para o público em geral, o Pandemic tem um tema mais fácil de assimilar, que causa menos restrições. Mas, honestamente, não é difícil convencer a aceitar o tema do Witch of Salem dizendo somente: "No jogo somos investigadores lutando para impedir que um culto maligno desperte um criatura de eras passadas que irá destruir o mundo". Contra isso não há anticorpos!

E é isso!

Abs,


Crédito das imagens, na ordem:
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Witch of Salem - resenha Empty Re: Witch of Salem - resenha

Mensagem por Binderman Seg Jul 08, 2019 10:31 am

Está na lista faz tempo, um dia eu consigo comprar.
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